CVM, fundos e compliance: como evitar infrações administrativas?

Mariana Fogaça
Mariana Fogaça Sócio
Ontem 15 minutos de leitura
CVM, fundos e compliance: como evitar infrações administrativas?

Fonte: Freepik.com

Os Fundos de Investimento são comunhões de recursos de investidores, organizados sob a forma de condomínio de natureza especial e destinados à aplicação coletiva em ativos financeiros.  

Diferentemente de uma empresa tradicional, o fundo não possui personalidade jurídica própria; trata-se de um ente despersonalizado, regido por seu regulamento interno e pela regulamentação da Comissão de Valores Mobiliários (CVM).  

E os Fundos DI? 

Fundos DI, por sua vez, são uma categoria de fundos de investimento referenciados na taxa DI – isto é, buscam acompanhar de perto a taxa de juros interbancária (CDI). Esses fundos DI se enquadram, na classificação da CVM, como Fundos de Renda Fixa Referenciados.  

Pela regulamentação da Resolução CVM 175, um fundo referenciado deve indicar no nome o índice de referência (por exemplo, “Referenciado DI”) e manter pelo menos 80% de seu patrimônio aplicado em títulos de renda fixa de baixo risco, especialmente títulos públicos federais ou papéis de risco equivalente. Além disso, os derivativos em um fundo DI só podem ser utilizados para proteção (hedge) da carteira, não para aumentar risco. 

Em suma, o Fundo DI é estruturado para ter baixo risco de crédito e volatilidade mínima, servindo como alternativa segura e líquida à poupança tradicional. 

Quem são os participantes dos Fundos DI? 

Do ponto de vista estrutural, tanto os Fundos DI quanto outros fundos contam com participantes bem definidos. 

  • O administrador do fundo (instituição fiduciária autorizada pela CVM) é responsável pela constituição e funcionamento do fundo, atuando como representante legal e zelando pelo cumprimento das normas.  
  • O gestor do fundo (também devidamente autorizado pela CVM) cuida da administração da carteira, tomando as decisões de investimento no dia a dia conforme a política definida.  
  • O custodiante, que guarda os ativos do fundo;  
  • O auditor independente, que revisa periodicamente as demonstrações contábeis; e, quando aplicável; 
  • O distribuidor, responsável pela oferta das cotas aos investidores.  

Todos esses agentes integram a estrutura de governança do fundo e estão sujeitos à supervisão da CVM no âmbito do mercado de capitais brasileiro. 

Documentação essencial e exigências de prospecto e regulamento 

Antes de lançar ou oferecer um fundo de investimento – incluindo um fundo DI – é preciso observar uma série de exigências documentais e regulatórias.  

O documento basilar de qualquer fundo é o Regulamento, que funciona como o contrato ou estatuto do fundo. Nele constam a política de investimento, os objetivos do fundo, o público-alvo (por exemplo, se é destinado ao varejo ou apenas a investidores qualificados), as taxas cobradas (taxa de administração, performance, etc.), regras de resgate, riscos envolvidos, entre outras disposições. O regulamento deve ser registrado na CVM e ficar acessível aos investidores interessados. 

Para fundos distribuídos publicamente, exige-se também a elaboração de um Prospecto – documento informativo detalhado que resume as características da oferta de cotas do fundo.  

O prospecto apresenta, de forma clara, os objetivos do fundo, sua estratégia, os principais riscos, dados sobre o administrador e gestor, e informações financeiras projetadas ou históricas, quando for o caso. 

A CVM, por meio de normas específicas, estabelece o conteúdo mínimo do prospecto e determina que ele seja entregue aos potenciais investidores antes da adesão.  

Vale destacar que a publicação do prospecto ou registro do fundo na CVM não representam garantia de rentabilidade ou aval de risco por parte do regulador – trata-se de um requisito de transparência para que o investidor tome uma decisão informada. 

Além do prospecto, a regulamentação brasileira introduziu a figura da Lâmina de Informações Essenciais, um documento síntese, padronizado, com as informações mais relevantes do fundo em linguagem acessível.  

De acordo com a Instrução CVM 555/2014 (revogada e substituída pela Resolução CVM 175/2022), todo fundo aberto destinado a não qualificados devia ter uma lâmina informativa.  

Atualmente, sob a  Resolução CVM 175, mantém-se essa obrigação de fornecer uma ficha simplificada destacando a política de investimento, taxas, desempenho e riscos do fundo 

O Regulamento, Prospecto e Lâmina constituem a documentação-chave que deve ser entregue e explicada aos investidores antes de qualquer investimento. 

É obrigação legal do administrador do fundo entregar gratuitamente a cada interessado uma cópia do Regulamento e da Lâmina de Informações Essenciais, além de sanar dúvidas antes que o investidor assine o termo de adesão e ciência de risco (documento pelo qual o investidor confirma ter lido e compreendido os riscos). 

Investidores e empresas que pretendam investir em cotas ou estruturar um fundo DI devem, portanto, atentar a toda essa documentação e verificar se ela está em conformidade com as normas da CVM. 

Divulgação de informações obrigatórias e requisitos de conformidade 

A transparência é um pilar fundamental na regulação de fundos pela CVM. Por exigência expressa da regulamentação, os fundos de investimento devem divulgar informações completas, abrangentes e equitativas a todos os cotistas, de forma simultânea e utilizando meios acessíveis (por exemplo, o site do administrador e canais eletrônicos). Essa divulgação abrange tanto informações periódicas quanto informações eventuais. 

Entre as informações periódicas obrigatórias estão os relatórios de desempenho (como informes mensais ou trimestrais), demonstrações contábeis anuais auditadas e, no caso de fundos abertos, a divulgação diária do valor da cota e do patrimônio líquido do fundo. Já as informações eventuais referem-se a fatos relevantes ou quaisquer acontecimentos que possam influenciar a decisão do investidor de aplicar ou resgatar suas cotas – por exemplo, uma mudança de gestor, alteração na política de investimento ou algum evento extraordinário de mercado que afete significativamente a carteira. Nesses casos, o administrador deve divulgar de forma imediata e ampla o fato relevante, garantindo que todos os cotistas e o público tenham acesso simultâneo à informação.  

Para assegurar o cumprimento dessas obrigações, a CVM exige que os administradores e gestores mantenham estruturas de compliance e controles internos robustos. Isso inclui políticas e procedimentos para atender às normas de conduta fiduciária, prevenção à lavagem de dinheiro, gerenciamento de riscos e divulgação de informações.  

Os administradores precisam, por exemplo, manter atualizados os cadastros dos cotistas e disponibilizar canais de atendimento eficientes.  

Assim, antes de investir em um fundo DI, o investidor deve verificar se o fundo cumpre essas obrigações. Por exemplo, se publica regularmente suas informações e se possui uma gestão transparente.  

Do mesmo modo, uma empresa que pretenda “operar” um fundo DI (isto é, lançar e administrar um fundo) deve estar devidamente autorizada pela CVM e preparada para atender a todos os requisitos normativos de divulgação, documentação e conformidade. 

Como verificar a regularidade de um fundo DI junto à CVM? 

Tanto investidores quanto empresas devem assegurar que um fundo DI está regularizado na CVM antes de qualquer investimento ou oferta.  

A CVM mantém sistemas públicos de consulta onde é possível verificar se o fundo possui registro ativo e obter seus dados cadastrais e documentos.  

No próprio site da Autarquia, a seção de Fundos de Investimento permite consulta por nome do fundo ou CNPJ, retornando informações como a data de registro, situação (ativo ou cancelado), administrador e gestor responsáveis, além de disponibilizar os documentos como Regulamento, Prospecto, Lâmina e relatórios periódicos.  

Para realizar essa verificação, o investidor pode acessar a página de Consulta a Fundos Registrados no site da CVM e digitar o nome (ou parte do nome) do fundo.  

O sistema listará os fundos correspondentes e, ao selecionar o fundo DI desejado, será possível examinar dados como o valor diário da cota, patrimônio líquido, número de cotistas, bem como baixar documentos oficiais do fundo. Essa diligência é altamente recomendável antes de investir, pois fundos inexistentes ou não registrados podem indicar fraudes ou esquemas irregulares. 

Essas informações são valiosas para checar, por exemplo, se o fundo DI em questão realmente existe, se está autorizado a funcionar e se está cumprindo suas obrigações de reporte. 

Além do cadastro formal, a CVM também divulga alertas ao mercado sobre atuações irregulares. Por exemplo, existe no site um rol de Ofertas irregulares identificadas, como pirâmides financeiras e esquemas que ofertam investimentos sem registro. Se um pretenso “fundo de investimento” estiver sendo oferecido fora do ambiente autorizado (sem passar por uma instituição financeira habilitada), é provável que a CVM emita uma stop order suspendendo a oferta e alerte os investidores.  

Por isso, ao verificar a regularidade de um fundo DI, deve-se não apenas conferir o registro no sistema da CVM, mas também certificar-se de que não haja nenhuma determinação da CVM suspendendo suas atividades ou qualquer notícia de investigação em curso. 

Responsabilidade de administradores, gestores e participantes por descumprimento das normas 

A atuação dos administradores e gestores de fundos de investimento, incluindo os de categoria DI, está submetida a deveres fiduciários rigorosos. Esses agentes devem sempre agir com diligência e lealdade em prol dos cotistas, cumprindo tanto o que determina a regulamentação quanto o estabelecido no regulamento do fundo.  

Quando ocorrem infrações às normas, a CVM pode instaurar Processos Administrativos Sancionadores para apurar responsabilidades e aplicar penalidades. As sanções administrativas previstas vão desde advertências e multas pecuniárias, até a suspensão ou cassação da autorização para atuar no mercado, sem prejuízo de eventuais responsabilidades civis ou penais cabíveis em casos mais graves. 

Um princípio fundamental é que o administrador fiduciário do fundo responde pelo fiel cumprimento de todas as obrigações do fundo e pela veracidade das informações divulgadas. Ele também tem o dever de supervisão sobre o gestor da carteira.  

Por exemplo, a antiga Instrução CVM 555/2014 (art. 92) já estabelecia que o administrador é responsável por prejuízos causados aos cotistas resultantes de negligência ou descumprimento de normas tanto por parte dele quanto do gestor contratado.  

Se o gestor cometer irregularidades que deveriam ter sido coibidas ou evitadas pelo administrador, este poderá ser considerado corresponsável. A nova Resolução CVM 175/2022 mantém essa linha de responsabilização, reforçando a necessidade de controles internos e governança. 

Caso Concreto 

A história regulatória traz casos relevantes envolvendo fundos DI. Um caso emblemático envolveu a determinada administradora de um fundo DI que cobrava taxa de administração de 8% ao ano, valor extremamente elevado para um fundo referenciado em CDI. A CVM entendeu que tal prática feria a relação fiduciária com os cotistas e os objetivos do fundo (que dificilmente conseguiria render próximo do CDI com custos tão altos).  

Em razão disso, em processo sancionador, houve a responsabilização da instituição e de seus diretores, considerando que a manutenção da taxa nesses patamares violava o dever fiduciário e prejudicava os cotistas. Esse caso deixa claro que a CVM atua contra práticas abusivas de administração – no caso, cobrando taxas incompatíveis com a natureza do fundo – e reforça que administradores devem zelar pelos melhores interesses dos investidores. 

Vale lembrar que os cotistas também dispõem de meios para buscar reparação de prejuízos sofridos por má gestão ou irregularidades. 

A esfera administrativa (CVM) apura e pune infrações às leis do mercado de capitais, mas na esfera cível um investidor lesado pode, em tese, acionar judicialmente os responsáveis (administrador ou gestor) por perdas decorrentes de gestão temerária ou violação do regulamento. A própria Lei da Liberdade Econômica reforçou que o regulamento do fundo pode delimitar a responsabilidade de cada agente, mas não exime administradores e gestores de responder por dolo ou má-fé. 

Em conclusão, operar ou investir em um fundo DI requer atenção tanto aos aspectos legais quanto operacionais. 

  • Do lado do investidor, é imprescindível examinar a documentação (regulamento, prospecto, lâmina), checar o registro do fundo na CVM e acompanhar a divulgação das informações obrigatórias. 
  • Do lado das empresas gestoras e administradoras, é fundamental cumprir rigorosamente os requisitos de documentação, prospecto, divulgação e conformidade, sob pena de responsabilização administrativa e reputacional.  

A CVM, como guardiã do mercado de capitais, tem mostrado em seus precedentes que infracções não serão toleradas – seja em fundos DI ou em qualquer outra modalidade – e que a proteção aos investidores e a ampla divulgação de informações são valores inegociáveis.  

Em um ambiente cada vez mais moderno e supervisionado, com auxílio, inclusive, de ferramentas tecnológicas e inteligência artificial na análise de dados, a mensagem é clara: a conformidade e a transparência não são apenas obrigações legais, mas também a melhor estratégia para promover a confiança e o desenvolvimento sustentável do mercado de fundos de investimento no Brasil. 

Se restarem quaisquer dúvidas sobre fundos de investimento, obrigações regulatórias ou atuação da CVM, a equipe da Garrastazu Advogados está à disposição.

Contamos com especialistas altamente capacitados em mercado de capitais e direito regulatório, prontos para oferecer orientação segura e personalizada para investidores e empresas gestoras.

Lembre-se:

1. O que caracteriza um fundo DI?
Fundos DI são fundos de renda fixa referenciados no CDI. Devem manter 80% do patrimônio em títulos de baixo risco e só usar derivativos para proteção (hedge).

2. Quais documentos são obrigatórios em um fundo DI?
Regulamento, Prospecto e Lâmina de Informações Essenciais são obrigatórios. Eles explicam regras, taxas, riscos e devem ser fornecidos antes da adesão.

3. Como saber se um fundo está registrado na CVM?
Acesse o site da CVM, vá à seção de fundos registrados e consulte por nome ou CNPJ. Lá constam documentos, gestor, situação e dados financeiros.

4. O que a CVM fiscaliza em um fundo?
Fiscaliza cumprimento de normas, divulgação de informações, estrutura de compliance, taxas abusivas e irregularidades por parte de gestores e administradores.

5. Quais os riscos de investir em fundo não regularizado?
Fundos sem registro podem ser fraudulentos. Investidores correm risco de perder recursos e não contar com a proteção da CVM.

 

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